Uma das locomotivas mais misteriosas deste País é sem duvidas a famosa “Cerâmica São Carlense”. Embora após exaustivas pesquisas em diversos veículos de informações e acervos disponíveis para pesquisa, até então, não consegui descobrir nada sobre a empresa em sim, mas aqui vão alguns dados interessantes da ferrovia para qual esta bela maquininha foi construída, e vou desmistificar algumas coisas ao seu respeito.
Encomendada à Baldwin Locomotives Works pela Cia Mechanica
& Importadora, deveria trafegar em uma linha estilo “decauville” desmontável,
em trilhos de 5 Kg por metro, divididos em seções de 5 metros contendo três
dormentes de aço rebitados aos trilhos, e mais três dormentes de madeira para
apoio por cada seção. A ferrovia tinha aproximadamente 10 quilômetros de
extensão, com curvas de 40 metros de raio e rampa máxima de 3%.
Foi entregue em outubro de 1892 sob o número de série 12972,
era do tipo 0-6-2T bitola de 60 cm, com tanque de água trazeiro, sem duvidas,
uma das menores locomotivas já construída. Possuía apenas 5 metros de comprimento,
rodas motrizes com 66 cm de diâmetro, cilindro (pistão) de 10 cm de diâmetro
por 30 cm de curso. Uma locomotiva bem diminuta ideal para o trabalho em uma
olaria, tracionando pequenas vagonetas em trilhos desmontáveis, assim como
pedia o projeto. Nos registros da Baldwin, apenas esta locomotiva foi
construída nestas características.
A locomotiva leva o nome “Francisco Cunha Bueno Junior”. O
pouco que pude apurar sobre este cidadão, que além de pertencer a famosa
família Cunha Bueno, era um político na cidade nos anos 90 do século XIX, o que
nos leva a crer que tivesse investimentos pela região, incluindo a própria
empresa cerâmica.
No entanto, esta maquina teve destino incerto. A grande
dificuldade no passado em mapear as diversas locomotivas gerou alguns equívocos
históricos, o que levou aos pesquisadores pioneiros a colocar esta bela
locomotiva na listagem de diversas ferrovias, inclusive ao mesmo tempo! Se
analisarmos alguns “rosters” feitos pelos primeiros pesquisadores, cruzaremos
os dados e perceberemos que ela foi “encaixada” nas lacunas vazias de diversas
ferrovias de bitola de 60 cm, aparecendo como se tivesse trabalhado na Estrada
de Ferro Perus Pirapora, Ramal Dumont, Ramal de Santa Rita, etc. Não é possível
confirmar a veracidade de todas estas passagens, no entanto, com o advento de
nossas novas pesquisas, e o surgimento de novas fontes, como os livros dos
fabricantes, acesso a relatórios das companhias ferroviárias, documentações
históricas outrora inacessíveis, hoje em dia descartamos inúmeros equívocos completando
corretamente as lacunas e desonerando essa pequena locomotiva de ter estado em
tantos lugares ao mesmo tempo!
A minha proposta, baseado na fotografia anexa, é que esta
maquina tenha terminado sua vida na Usina Monte Alegre em Piracicaba - SP, modificada em suas
oficinas pelo gênio da mecânica João Bottene. Segundo as características dos
desenhos técnicos (gentilmente enviados a mim pelo amigo Thor Winbergs), pela
ficha técnica da Baldwin Locomotives Works e pela fotografia do respeitado
Calrheinz Hahmann, da coleção do amigo Eduardo Coelho, podemos notar as
semelhanças mecânicas, bem diminutas, da locomotiva na usina (vide ambas fotos
do artigo). Como não houve outras maquinas com características mecânicas
idênticas, mas existem as modificações, com adição do clássico tanque cela em
formato de “foguete”, modificação da cabine, e alguns detalhes mais, é bem
plausível afirmar que se trata da mesma maquina.
As pesquisas continuarão até que seja encontrado algo maior
sobre a empresa, em si, e a confirmação da destinação e fim desta tão bela e
pequena locomotiva. No entanto, um pouco sobre ela já sabemos, pelo menos!
L. Guidini escreveu em
24/08/2020