Estação de Cravinhos, a esquerda, o ramal da EFVRP, a direita, a linha tronco original da Cia Mogiana.
A região oeste do Estado de São
Paulo concentrava a maior produção de café do País, sendo a região de Cravinhos,
São Simão e Ribeirão Preto uma das mais importantes produtoras, com grandes
fazendas e empresas agrícolas em seu território.
Talvez, de todos os ramais
agrícolas estudados, este seja o que possui a história mais nebulosa, sem
grandes menções oficiais e mesmo com pouquíssimas fotografias disponíveis à
consulta. Sua história começa em outra ferrovia particular, a Cia Agrícola do
Ribeirão Preto (CARP). Em fins do século XIX, era seu presidente o engenheiro
civil Rufino Augusto de Almeida que, em assembleia geral de abril de 1895, por
deliberação favorável a mudança da sede da cidade do Rio de Janeiro para São
Paulo, decide pela sua demissão do cargo. Acredita-se que a visão de Rufino
para a ferrovia da CARP era outra (entenda a história da CARP aqui).
Possivelmente, Rufino tinha planos de expandir tal ferrovia, para atingir novas
freguesias e possivelmente chegar ao sul de Minas Gerais, região também rica em
cafezais.
Com esta visão, reúne um grupo de
fazendeiros empreendedores da região de Cravinhos, não contemplados pelo
sistema de transporte oferecido pela CARP, e sua ferrovia de uso exclusivo, e
formam em 1897 no Rio de Janeiro (a Capital Federal na época), uma ferrovia
agrícola, denominada Estrada de Ferro Vicinal do Ribeirão Preto (EFVRP) com um
capital de 600:00$000, (rebaixado para 400:000$000 em assembleia de 1899, com
intenção de tornar-se mais fácil a distribuição de dividendos), autorizada a
iniciar-se na linha tronco da Cia Mogiana (CM) e seguir em direção as barrancas
do rio pardo de zona privilegiada de seis quilômetro de cada lado da via, sendo
seus estatutos aprovados pelo Governo em 15 de julho de 1897. Em 1904, muda sua
sede da cidade do Rio de Janeiro para Cravinhos, a fim de ficar sua diretoria
mais próxima dos clientes e do dia-a-dia operacional.
Inicialmente, a pequena ferrovia,
construída em bitola de 60 cm, partia da estação de Cravinhos, na linha tronco
da CM, e atingia a estação de Alvarenga, com pouco mais de 20 quilômetros de
extensão, passando pela estação de Nogueira, no quilometro 14, cruzando
diversas e importantes fazendas da região, como a fazenda Posse da Figueira.
Por toda a extensão da linha, haviam “diversos abrigos particulares” e um
triângulo de reversão nas proximidades da estação, e uma área de 2400 m² da
oficina na estação de Cravinhos. O material rodante original da ferrovia era
composto por três locomotivas, dois carros de passageiros tipo “bonde aberto” e
dez vagões de cargas. Os vagões foram construídos em suas próprias oficinas,
entre 1897 e 1898, sendo: Carros de passageiros marca “Trajano de Medeiros -
RJ” comprados em 1897; Locomotivas, duas americanas marca Baldwin, 0-6-2st,
números de série 14216 e 14217 fabricadas em 1898, e uma francesa marca
Klingelhofer (fabricante vinculado à Decauville), 0-6-2t número de série 293
fabricadas em 1899. As locomotivas
levavam os respectivos nomes de seus fundadores, “Rufino de Almeida”, “Dr. A.
Jordão” e “José Ignacio”.
O ramal fora aberto ao tráfego
aproximadamente em 1898/99, mas desde 18 de outubro de 1895, este mesmo grupo
de empreendedores através da empresa “Rufino A. de Almeida & Comp.” já
possuía contrato com a municipalidade de Cravinhos para a iluminação pública e
particular, o mesmo retificado em junho de 1900 e unificado em 21 de junho de
1906. A energia elétrica representava grande parcela da receita da EFVRP,
chegando a representar em alguns períodos o maior lucro da companhia, com
energia produzida à vapor nas dependências das oficinas de Cravinhos. Tal
oficina também participava de receita, pois eram executados serviços extras a particulares,
além dos serviços corriqueiros da ferrovia.
Primeira expansão
Em 21 de junho de 1906, a citada
unificação dos contratos visava uma melhoria nas condições da EFVRP. Neste
contrato, algumas cláusulas previam o aumento do pátio na estação de Cravinhos,
melhorias no sistema de iluminação, novas tarifas para a cobrança desta
iluminação e obrigação de que o ramal de Jandaia fosse prolongado até as
margens do rio pardo, cumprindo-se assim a concessão feita na formação da EFVRP
com a municipalidade. Em contrapartida, alguns benefícios seriam gerados, sendo
o mais interessante a isenção total de impostos municipais sobre a companhia.
Este prolongamento bifurcava-se a
pouco mais de 6 quilômetros da estação de Cravinhos, chegando até a estação
denominada Doutor Senna, com aproximadamente 14 quilômetros de extensão. Estava
a ferrovia, neta época, com aproximadamente 35 quilômetros de extensão, 3
estações, diversas paradas, três locomotivas, quatro carros de passageiros e
dez vagões de carga.
Mesmo com tudo isso, a ferrovia
seguia quase deficitária, com suas contas dando apenas para o custeio. O
primeiro ano em que a pequena ferrovia vê lucros é 1909, quando foi possível
que fosse feita uma distribuição de dividendos, e foi sugerida a criação de um
fundo de reserva para o pagamento das dividas da estrada. O aumento no tráfego,
devido a construção do ramal de Jandaia, e a boa safra de café de 1908 abrem a
necessidade de que dois carros de passageiros sejam construídos nas oficinas da
EFVRP, para suprir a demanda, e são entregues ao tráfego em 1909. Na empolgante
ata da assembleia de 1909, a diretoria não deixa de comentar a necessidade e
importância do prolongamento para Serrinha (atual Serrana): “Não devo calar aqui o valor do
prolongamento da estrada de Serrinha, em favor do qual hei de falar até que
vós, srs accionistas, vos capaciteis da necessidade delle para a garantia do
futuro de nossa companhia” (DOSP 28/05/1909 – pag 1030).
A venda para a Cia Mogiana
A pequena estrada de ferro levou
mais de 10 anos para se mostrar eficiente, isso gerou desgosto com os
acionistas, que não levaram em consideração os benefícios trazidos pelo ramal
para a cidade de Cravinhos e, após a morte de seu fundador, Rufino de Almeida
em 1904, publica a seguinte nota: “Desde
muito tempo, vem quasi unanime, entre os accionistas o pensamento de venda
desta estrada. Em palestras intimas, nas reuniões de Assembleia Geral, sempre
que a gerencia reclamava para dar impulso ao movimento para sair
da pasmaceira – Pois a estrada com a mais restricta economia – so dava para o
custeio (...) ainda mais difícil, vender uma estrada de pequeno percurso,
tributaria de outra em que tudo lhe dificultava, uma estrada que sofria
concorrências de carroças e ate de carros de boi (...) Mas a venda precisava
ser feita, porque os accionistas não queriam nem ouvir falar em embarcar um só
vintém (...)” (OESP 08/12/1909 – pag 9).
Desta forma, ficou decidida a
venda da EFVRP para a CM em 18/11/1909, pelo preço de 471:200$000 (quatrocentos
e setenta e um contos e duzentos mil réis), de toda a ferrovia, material
rodante, estações e obras de arte, linha telefônica e concessões já
estabelecidas, com exceção do contrato de iluminação pública e particular, que
se manteve com os antigos donos, sendo clausula de que, durante o período de um
ano os equipamentos da iluminação ainda pudessem ser utilizados nas
dependências das oficinas de Cravinhos, até que novo local fosse construído.
Em janeiro de 1910, tendo posse
do referido termo de concessão com a municipalidade de Matto Grosso de Batataes
(atual Batatais), que, atravessando o rio pardo atingisse a cidade, em zona
privilegiada de 8 quilômetros, para atingir as barrancas do rio sapucai, cruzando
diversas zonas produtivas. Tal extensão partiria da nova estação de Arantes, no
ramal de Jandaia, e prosseguiria com um total de 68 quilômetros, terminando na
localidade denominada Jatobá. Contudo, este prolongamento nunca chegou a ser
executado.
Algumas melhorias foram feitas
para o estabelecimento do tráfego no ramal, sendo a construção de algumas
estações, Bifurcação, no km 6,373; Manoel Amaro, no Km 14,831; Fagundes, no Km
9,216 do ramal de Jandaia e Arantes, no Km 15,469 do ramal de Jandaia.
Em duas representações,
11/01/1911 e 19/06/1911, foi requerida ao Governo Estadual a licença para a
construção, uso e gozo de um prolongamento que partindo da estação de Alvarenga
termine em Serrana. Tal licença foi dada através do Decreto 2178 de 6/12/1911,
sendo em 1912 os projetos apresentados da extensão de 8260 metros, aprovados
pelo Decreto 2209 de 28/02/1912. A Obra ficou a cargo do empreiteiro Antônio da
Silva Lavanderia, com custo total de 338:709$425, com obras iniciadas em 1913,
e concluídas em 1914.
Após esta data, não houveram
grandes mudanças no então “Ramal de Cravinhos” e “Sub-ramal de Jandaia”. Talvez
por influência da Estrada de Ferro São Paulo – Minas, que cruzava o ramal em
Serrana, e possivelmente por força de privilégios das duas ferrovias, que possuíam
o mesmo interesse de alcançar os cafezais do sul de Minas Gerais. Ele seguiu
operacional, deficitário, até aproximadamente 1956, quando é decidido pelo seu
fechamento, juntamente com o fechamento do outro ramal de bitola de 60 cm da
CM, em Serra Negra. A própria estação de Cravinhos não duraria muito tempo
mais, sendo fechada em 1964 na época da retificação da linha tronco da CM. Todo
o material rodante foi sucateado, sobrando nos dias de hoje apenas os prédios
das estações, com exceção de Serrana. Chegava ao fim mais uma das ferrovias
agrícolas que povoavam e mudavam os cenários do oeste paulista.
L. Guidini escreveu em
18/01/2015
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